sábado, 28 de novembro de 2009

Teorias e expectativas na tradução do texto sagrado

Atualmente, diversas teorias da tradução têm sido expostas por teóricos e por tradutores. Uns, como Van Bruggen (1978), acreditam ser necessário traduzir literalmente conservando a estrutura do texto-fonte e fazendo somente algumas adaptações advindas das diferenças entre a língua-fonte e a língua-alvo. Outros, como Nida e Taber (1982), acreditam que seja possível encontrar um equivalente na língua-alvo de forma que o receptor tenha a reprodução do texto com a mesma relevância que teve na época bíblica. Ainda outros, como Derrida (1998) e Arrojo (1992), veem a tradução como ‘desconstrução’, ou seja, como uma prática linguística que ‘descanoniza’ o original, fazendo com que um texto sobreviva.


Essa concepção teórica que entende o original fora do centro dificilmente é aceita por um receptor de tradução de texto sagrado. Uma das prioridades desse leitor é a reprodução do original. Suas expectativas voltam-se à revelação do que Deus disse em sua palavra. Logo, não há espaço para uma recriação, pois esta se tornaria uma reprodução humana e não a retransmissão da voz divina.

Beekman e Callow (1992) apresentam quatro tipos de tradução analisando seus estilos e a aceitabilidade de cada uma. São elas: a) literal demais; b) literal modificada; c) idiomática; d) livre demais. O quadro abaixo resume a questão da aceitação de cada uma delas.

Van Bruggen (1978, p. 97), como teólogo, teoriza a questão da tradução tendo especificamente como foco a Bíblia. Para ele, esta é a Palavra de Deus e, como tal, não precisa ser adaptada nem alterada.

Nota-se, pelo quadro, que os dois extremos são considerados inaceitáveis, e os tipos intermediários apresentam-se como aceitáveis. Os autores comentam primeiramente os dois extremos: a ‘literal demais’ e a ‘livre demais’. Em relação ao primeiro tipo, indicam que a tradução visa a reproduzir as características da língua original tal como se encontra no texto-fonte. Isso dificulta a compreensão, pois as estruturas das línguas divergem e, sem uma adaptação, a tradução não alcançará seu propósito comunicativo. Além disso, a reprodução da estrutura original poderá provocar entendimentos equivocados sobre a mensagem. Sem identificar a mensagem, o leitor não conseguirá acessar esse tipo de tradução. Já, na tradução ‘livre demais’, não há preocupação com as formas linguísticas da mensagem original. Sua intenção é tornar o texto tão claro e relevante quanto possível. Isso proporciona distorções de conteúdo que comprometem a tradução.

Os dois tipos intermediários, a ‘literal modificada’ e a ‘idiomática’, buscam encontrar um equilíbrio entre os dois extremos citados. O primeiro tipo de tradução, a ‘literal modificada’, é uma adaptação da tradução ‘literal demais’. Esse tipo de tradução tem por finalidade fazer alguns ajustes gramaticais e lexicais para corrigir erros na língua-alvo. Contudo, a tradução torna-se aceitável para um grupo de pessoas que tenha acesso a obras de referência sobre contexto bíblico e que aprecie o estudo do texto. O outro tipo de tradução, a ‘idiomática’, é aquela em que o tradutor busca reproduzir para os leitores da língua-alvo o significado do original, usando as formas lexicais e a gramática natural dessa língua. Nesse tipo, entende-se que as línguas possuem formas diferentes devendo a tradução adaptar-se às especificidades de cada língua. A aceitação desse tipo de tradução advém justamente da clareza do texto expressa na língua-alvo.

Pode-se, então, perceber, observando esses dois tipos aceitáveis de tradução, que o receptor cria pelo menos duas expectativas essenciais em relação à tradução. A primeira que mais se espera é a retransmissão do ‘Original’. O leitor de um texto sagrado quer ler o original apesar de saber que ele é mediado por uma tradução. A segunda expectativa, por sua vez, é a de que a tradução seja clara, compreensível e que alcance seu objetivo comunicativo. As duas expectativas colocam o tradutor em uma difícil tarefa: buscar o equilíbrio mesmo sabendo das limitações linguísticas, históricas e sociais a que um texto se sujeita.

Mariú Lopes é formada em Teologia, pelo Seminário Teológico Betel Brasileiro (2002), e em Letras-Tradutor, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2004). Mestre em Letras/Linguística pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2008) e doutoranda do Programa de Pós-graduação em Letras, pela mesma instituição.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARROJO, R. A tradução passada a limpo e a visibilidade do tradutor. Trabalhos em Linguística Aplicada. Campinas: Editora da UNICAMP, 1992.
BEEKMAN, J.; CALLOW, J. A arte de interpretar e comunicar a Palavra escrita: técnicas de tradução da Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 1992.
DERRIDA, J. Carta a um amigo japonês. In: OTTONI, P. (Org.). Tradução: a prática da diferença. Campinas, UNICAMP, 1998.
NIDA, E. A.; TABER, C. R. The theory and practice of translation. Leiden: Brill, 1982.
VAN BRUGGEN, J. The future of the bible. Nashville: Thomas Nelson, 1978.


Fonte: Portal Vida Nova

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