segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Na Etiópia, uma folha governa a vida das pessoas


BAHIR DAR, Etiópia — Sua vida gira em torno de uma folha de psicotrópico.
Yeshmebet Asmamaw, 25, mastiga a droga em um ritual que ela criou. Ela estende folhas de papiro no chão de sua casa, faz café e queima olíbano. Depois, faz uma bolinha apertada com algumas pitadas de folhas de khat e a põe na boca.
“Adoro isso”, disse, acrescentando que fica mastigando até na plantação onde trabalha colhendo as folhas.
Os etíopes há muito tempo mastigam o khat, mas a prática era limitada às regiões muçulmanas, onde os fiéis mastigavam as folhas para ajudá-los a orar por períodos prolongados, principalmente na época do jejum no Ramadã.
Mas nos últimos anos, o cultivo e o consumo do khat se espalharam entre outras populações e em regiões como Amhara, na maior parte cristã ortodoxa, e no interior.
“Se você mastiga as folhas nestes lugares, é um homem morto”, disse Abhi, 30, que pediu para não ser identificado. “Minha família não me consideraria mais seu filho”.
O mais alarmante, segundo as autoridades, é o número de jovens que hoje consomem khat. Cerca da metade dos jovens na Etiópia adotou esta prática.
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Pesando khat no mercado. Cerca da metade dos jovens da Etiópia mastiga a folha. (Tiska Negeri para The New York Times)
O governo etíope teme que o hábito possa frustrar seus planos de transformar a Etiópia em um país de renda média em menos de dez anos — um empreendimento nacional que exigirá um exército de jovens trabalhadores capazes, afirmou. Bilhões de dólares já foram gastos em parques industriais, rodovias, ferrovias, aeroportos e outras obras de infraestrutura, inclusive a maior barragem da África. Segundo estatísticas oficiais, a economia cresce, há mais de 10 anos, a uma taxa de 10% ao ano.
Mas o khat é legal e é uma grande fonte de receitas para o governo. Meio milhão de hectares é destinado a este produto, cerca de três vezes mais do que 20 anos atrás. E a quantidade de recursos por hectare gerados por ele ultrapassa todas as outras culturas, inclusive a do café, a maior exportação da Etiópia, disse Gessesse Dessie, pesquisador do Centro de Estudos Africanos da Universidade de Leiden. Milhares de trabalhadores hoje se dedicam a esta cultura, comentou.
Muitos de seus consumidores são jovens, que constituem cerca de 70% da população de 100 milhões de pessoas do país, mas que não sentiram os efeitos do chamado milagre econômico da etiópe. É, principalmente, por causa da falta de empregos que eles recorrem ao khat.
Os efeitos da folha variam dependendo da quantidade consumida e de sua qualidade. Alguns usuários sentem um aumento da temperatura e ficam agitados, outros se tornam mais concentrados no que estão fazendo. O abuso crônico, alerta o governo dos Estados Unidos, pode levar ao esgotamento, “a um comportamento maníaco com exageradas decepções, violência, depressão suicida ou psicose esquizofrênica”.
Mulugeta Getahun, 32, estudou arquitetura, mas trabalha como agricultor.
“Eu mastigo khat quando não tenho emprego”, disse. “Nada me entretém mais do que o khat”.

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