sábado, 30 de junho de 2012

INFANTICÍDIO: O que vale mais: a Cultura ou a Vida?

Manifestação contra o infanticídio realizada em 2008 no Rio de Janeiro


Ronaldo Bastos

O que deve prevalecer em uma sociedade? A Cultura ou a Vida? 

            Quem é quem ou quem é o que? A cultura é filha da Lei ou a Lei é filha da cultura?
             Nos surgiu essa dúvida porque temos lutado para conscientizar (NÃO criminalizar) os indígenas da selva amazônicae regiões que a prática do infanticídio é ruim para a perpetuação da tribo, comunidade etc.
            Existem tribos com apenas 100, 70, indivíduos e em muitas etnias nascem em média 5 crianças por ano e nos rituais de morte, morrem 5 no mesmo ano. Há tribos que chamamos de minoritárias onde existem apenas 8, 6, 4 indivíduos.
No Brasil, infelizmente, tem pessoas que se posicionam a favor do infanticídio alegando dezenas de argumentos. Certo é que nenhum meio justifica o infanticidio! Em alguns casos a indígena vai sozinha para dentro do mato e então ela decide pela vida ou morte do bebê. Existem alguns meios de se tirar a vida da criança caso a mãe indígena não queira que ele viva. Você conhece algum? Não? Vejamos alguns:
Em certos casos enche-se a boca do recém-nascido com folhas para que ele morra sufocado, ou a mãe o coloca em suas pernas de barriga para cima e quebra-o ao meio, ou coloca-se em sua boca uma raiz chamada timbó (veneno). Há etnias que jogam dentro do Rio para o Boto Cor -de- Rosa “comer” e ainda, abandonam as crianças na mata.
Existem entidades que se dizem ser de Direito  à Vida, mas são  a favor do infanticídio, algo que não da para entender! Dizem que é  por causa do  “respeito  à cultura indígena”, se esquecendo que o infanticídio vai de encontro a Constituição Federal que em  seu  Art. 5º  diz: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a  inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. O ECA(1) diz no Art. 4º “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade,  a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.
Os Antropólogos, em sua maioria, também partem a favor da prática do infanticídio. Se esquecendo que a cultura é mutável, o que hoje é verdade absoluta amanhã pode deixar de ser! O que ontem era cultural hoje não é mais! As Leis, a cultura, podem mudar, mais nunca para acabar com a vida de alguém!
Se você fizer uma busca no Google verá que a palavra vida aparece cerca de 3 vezes mais que a palavra infanticídio. Fazendo uma avaliação crua a esse respeito pode se presumir que a vida desperta mais interesse do que a morte. Ainda estamos focados nas ações intermediarias sem nos preocuparmos com o fim e o infanticídio é o FIM! Fim de vidas inocentes, de seres humanos que não tem o direito sequer  de viver, pois essa escolha não lhes é  dada.
Assim  vivemos na era das contradições, pois,  na Constituição Federal, Art 226 § 8o diz  "O Estado assegurará a assistência á família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismo para coibir a violência no âmbito de suas relações". Surge a dúvida, o infanticidio não é uma violência ou as relações indígenas não são consideradas relações familiares? Sendo assim não alcançada pela carta magna?
               Participei da comemoração dos 20 anos do ECA na Escola de Magistrados no Rio de Janeiro no ano de 2010 e me dirigi a uma  Conselheira Tutelar perguntando se ela era a favor do infanticídio. Para minha surpresa  a conselheira que estava formando a mesa  era a favor do infanticídio em casos de tribos nômades, onde  existem crianças portadoras de necessidades especiais, porque  (segundo ela) a criança  pode  “atrapalhar” a tribo em sua movimentação pela selva. Pensamento mesquinho! Então essa “conselheira” deve ser a favor de matar as crianças que nascem com necessidades especiais nas cidades grandes ou interiores, no meio de família simples que não tem carro, trabalho fixo e recursos para medicamentos e tratamento adequados? CLARO que NÃO se pode agir dessa forma!
No caso de órgãos do Governo como, FUNAI e FUNASA, penso serem outros os motivos a qual os levam a serem a favor do infanticídio. Relatórios desses que deveriam cuidar dos nativos são incompletos, porque não trazem os reais dados onde não constam as mortes de bebês em rituais quando a criança é indesejada,de mães solteiras, portadores de deficiências, as que são comidas por jacarés, engolidas por sucuri, afogadas no Rio ou picadas de cobra. Aliás, você já leu em algum jornal de grande circulação uma nota se quer, com esse tipo de morte no meio indígena?
Tão grave quanto isso tudo é o trabalho infantil nas aldeias. Bem sei que há famílias que precisam trabalhar e muito, para a sua subsistência, mas tapar os olhos para uma situação gritante JAMAIS! Precisamos discutir até onde é perpetuação da cultura, subsistência familiar, preservação cultural e TRABALHO INFANTIL!(2)
Um dos últimos relatórios da FUNASA diz que para cada 1.000 nascidos vivos (índios) morrem 27. Com absoluta certeza digo que esse número pode chegar a mais de 60 para cada 1.000, pois, não são contabilizadas simplesmente para maquiar uma realidade que conheço bem por visitá-los com freqüência. Preferem preservar o nome Brasil a preservarem os que compõem o Brasil. Eles se esquecem que o ideal é pensarmos nas pessoas, depois, bem depois nas coisas!
Entendemos que prática cultural é tudo aquilo que NÃO prejudica a vida humana, seja de crianças, adolescentes, adultos ou idosos. Entendemos que a dança, pintura, músicas, língua, casamento entre os da mesma etnia, tambor etc., as mesmas são culturas que DEVEM ser preservadas! Mas,  bebidas forte, rituais sangrentos, morte de pessoas, trabalho infantil... Não penso ser cultural, o que não é bom na cultura do branco NÃO deve ser bom na cultura dos nativos.
Vejamos: Na cultura do branco  não pode beber e dirigir, mas  antes tínhamos essa  “cultura”  então porque não pensarmos em deixar a prática do infanticídio? A cultura de Káriûa (homem branco em nheengatu) não pode diferenciar da indígena no que tange preservar VIDA, conforme o Art. 227, da Constituição Federal!

Mudança cultural

Nossos avôs usavam  chapéus, hoje  se usa o corte moicano, antes íamos ao armarinho, hoje, às lojas deconveniências e Drive Trhu, íamos à mercearia hoje vamos aos hipermercados, antes íamos ao sapateiro, hoje, sapateiro é só para guardar as dezenas de pares de sapatos. Estamos na era dos I’pods, notebooks, e-books, TV de plasma, celulares que filmam, fotografam, que suportam 4 chips, se foi bom tudo isso ter mudado a nosso favor, porque não mudar a prática do infanticídio? A  Lei Maria  da  Penha(3) veio frear uma cultura machista. Sonho em findar com o  pensamento favorável ao infanticídio nas aldeias indígenas e muito mais FORA DELAS!
A “cultura” que Hitler queria implantar não deu certo, porque era ruim às pessoas e tinha o mesmo cunho dacultura do infanticídio, a de MATAR INOCENTES, lá, judeus, gays, negros, ciganos e outras minorias... Aqui, crianças indefesas, recém-nascidos ou já adolescentes.
Só quem vive nas aldeias sabe o que é assistir uma criança morrer de malária e não poder fazer muita coisa além de pedir a Deus que a cure. Faltando um membro por causa do facão no corte de cana. Adolescente se matar por que seu pai não tinha dinheiro para comprar os livros escolares, e logo depois seu pai se matar por pensar ser culpado da morte do filho. São realidades muito complexas e vividas todos os dias, sem meios e condições para mudá-las.
Através de pesquisas (missionárias) se detectou a prática do infanticídio em pelo menos 13 etnias, como os  ianomâmis, os tapirapés e os madihas. Só os ianomâmis, em 2004, mataram cerca de 98 crianças. Os kamaiurás, matam entre 20 e 30 por ano. Temos ido a dezenas de lugares falarmos da causa indígena, levantando uma bandeira a favor de quem não tem {ainda} voz forte na sociedade. Na região Norte do País ainda é forte essa prática.
Convido a você que é a favor do infanticidio a entrar floresta adentro para quem sabe mudar seus pensamentos a favor do infanticídio! Pergunte a uma mãe que praticou o infanticidio se ela está feliz? Talvez você não tenha pensado o quando isso abala psicologicamente a família, a aldeia, e todos que estão próximos.
As crianças indígenas estão a frente da linha do descaso.

Em breve “Direitos Violados das Crianças Indígenas”. Um Filme da Missão Brasil

Por Ronaldo Bastos – Missão Brasil - ronaldo@missaobrasil.org.br;
Colaboração de:
Ana Cristina – Assistente Social – anasilva_1@yahoo.com.br;
Margareth Dos Anjos Santos – Assessora de Comunicação - margteixeira@hotmail.com;                            

Notas
1. Estatuto da Criança e do Adolescente;
2. Em breve artigo – Trabalho infantil indígena uma realidade escondida.
3. A Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06), criada para prevenir e coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. A  Lei ganhou este nome em homenagem à Mariada Penha Maia Fernandes, biofarmacêutica cearense que foi casada com o professor universitário Marco Antonio Herredia Viveros, que tentou assassiná-la por duas vezes. A Lei Maria da Penha veio colocar um freio na “cultura” de se agredir as mulheres. Grifo nosso.

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